O divórcio, quando existem filhos, torna-se uma situação ainda mais complexa, gerando frustrações, angústias e receios, especialmente no que diz respeito ao afastamento entre a(s) criança(s) e o genitor que deixa o lar. O conflito entre os pais exige da criança a capacidade de se adaptar à nova realidade imposta de uma maneira invasiva, de modo que, muitas vezes, esta passe a se manifestar menos sobre seus sentimentos, ocasionando, em muitos casos, o afastamento emocional em relação ao genitor com o qual não mais convive diariamente.
Entretanto, para os pais de crianças com espectro autista, a realidade é ainda mais complicada, exigindo atenção e cuidados redobrados. Por vezes, ainda que utilizadas estratégias como a guarda compartilhada, as dificuldades enfrentadas acarretam na desestruturação da família, na não adaptação da criança à nova rotina e em desafios diários a fim de garantir o bem-estar do menor, este tão sensível às mudanças que ocorrem ao seu redor.
Para estas crianças, a necessidade de uma rotina inalterada é essencial para a sua qualidade de vida, pois a simples quebra deste cotidiano pode acarretar em efeitos prejudiciais à interação social e aumento do seu isolamento. Assim, no caso de um divórcio conturbado e divisão dos lares, espera-se que ambos os genitores tenham plena consciência e maturidade para adaptar a criança à sua nova realidade, ainda que seja uma tarefa de difícil concretização. Para isso, é essencial que profissionais com experiência específica sobre o tema sejam utilizados como peça chave nesse momento, visando a auxiliar na construção da nova rotina e de hábitos saudáveis ao desenvolvimento daquele infante, trabalhando na manutenção dos laços familiares com ambos os genitores da forma mais natural possível.
Nesse sentido, ressalta-se que as crianças com autismo podem enfrentar sérios problemas de desenvolvimento da linguagem, nos processos de comunicação, comportamento e interação social. Por essa razão, a individualização do tratamento é essencial, cabendo ao profissional, portanto, saber trabalhar de acordo com as especificidades de cada caso.
Trazendo a temática para a área do Direito, nos casos de divórcio litigioso envolvendo crianças autistas, o Poder Judiciário é auxiliado por profissionais das ciências do comportamento capacitados para atuar nos processos em que existe a necessidade de extremo cuidado para pactuar sobre a vida da criança autista após o divórcio dos genitores. Entretanto, observa-se, em alguns casos, que o profissional nomeado pelo Juiz possui certa dificuldade em desenvolver uma comunicação com a criança para realização da avaliação, muitas vezes pelo distanciamento entre o expert e o infante, sendo inexitoso, portanto, em trazer para o seu parecer uma detalhada análise da situação enfrentada pela criança.
Isso pode ocorrer em virtude de o profissional não saber lidar com as características especiais das crianças com autismo ou mesmo por não personalizar o tratamento, considerando que cada criança apresenta um nível de desenvolvimento diferente, possuindo, portanto, necessidades diversas em termos de proximidade e acompanhamento. Além disso, a comunicação da criança pode ser muito dificultada quando esta passa por uma situação de estresse elevado, às vezes traumática, como a separação dos pais. Assim, prevalece a necessidade de uma análise detalhada de cada caso concreto, buscando se distanciar de qualquer generalização do tratamento, sobretudo por se tratar de crianças que demandam atenção particular.
Nesse contexto, para a produção de laudos fidedignos é necessária uma atuação especialmente adaptada às nuances do caso concreto entre o profissional e a criança autista. A prática no Judiciário demonstra, no entanto, que, por vezes, os pareceres são dotados de informações genéricas, justamente pela atuação distanciada do expert em relação àquela família, de modo que acabam pouco contribuindo para a condução do caso. Percebe-se, assim, ser imprescindível a qualificação específica dos profissionais auxiliares do Poder Judiciário nas áreas da Psicologia, Psiquiatria e Assistência Social a fim de que seus laudos possam contribuir de forma efetiva para a futura conclusão do juiz acerca da nova rotina de convivência a ser estabelecida entre a criança autista e seus genitores em uma situação de divórcio.